Artes marciais – Toxidade interpessoal, liberdade e livre arbítrio

 

Todos nós, em alguma parte da nossa vida, já fomos confrontados a nos relacionar quer seja por vontade própria ou não com pessoas tóxicas através do trabalho, das amizades, ou por vezes em termos emocionais e familiares. Os tóxicos tendem a ser muito simpáticos e sedutores até conquistarem a pessoa, porém, sempre tentando chamar a atenção sobre si.

​Em geral, os tóxicos são controladores e nunca dão a oportunidade do outro manifestar a opinião ou, quando permitem e esta demonstra ser contrária aos interesses, acabam por posicionarem-se com vítimas, nunca tendo a culpa por nada. Pessoas tóxicas acabam por ser destrutivas pois não respeitam os espaços dos outros, impondo à força, a sua presença – aqui cabe um parêntesis: lembremos que, num mundo globalizado, nem sempre a presença necessita ser física, bastando o “controle” por meio digital.

Essa toxidade não permeia somente o ambiente de trabalho ou familiar. Infelizmente, está muito presente também nas artes marciais.

Quando professores e mestres, abdicam do espírito marcial visando apenas “business” (fato comum hoje em dia, em parte por culpa daqueles que almejam somente a faixa-preta, seja por status, seja por questões de “negócio” também), a tendência é revelarem-se tóxicos frente à confrontação daqueles que ali treinam respeitando o caminho marcial e buscam, na Arte Marcial, o real espírito de treinos, desafios diários e paz de espírito.

É aí que entram a liberdade e o livre-arbítrio.

A liberdade se diferencia do livre-arbítrio pelo fato de que, enquanto a primeira tem sua expressão no mundo externo, o último a tem no interior do indivíduo.

A liberdade de culto, de palavra, de comércio, como a de caráter político, social ou econômico, são produtos de uma manifestação que transcende o foro interno do homem. Essa liberdade é requerida por uma necessidade lógica da convivência humana e é, ao mesmo tempo, imprescindível para que as faculdades do indivíduo encontrem campo mais propício para seu desenvolvimento e função. Condená-lo a suportar uma opressão (muitas vezes provocada por indivíduos tóxicos) que o prive de sua liberdade é submetê-lo a um virtual embrutecimento.

Não faz sentido, manter certa dependência de professores e mestres tóxicos. Em termos relacionais torna-se difícil a interação humana, o caos impera. Devemos nos manter distante e nos retirar, estrategicamente, quando alguém apresentar comportamentos tóxicos de maneira consistente.

Ninguém absorve conhecimento em um ambiente opressor, sem paz interior, nada se alcança.

Conforme já publiquei em outro artigo, os professores/mestres são na realidade os orientadores. Um mestre não é um deus a ser adorado. Mimo não estraga somente crianças. Existe também o adulto mimado, que é mais impertinente e egocêntrico. O orientador nos guia pelo Caminho Marcial, mas não é o Caminho.

Mesmo hoje, existem orientadores que gostam de bajuladores. Confundem o merecimento de respeito por ser o guia, terceirizando aos seus alunos todas suas necessidades particulares.

Respeitar, significa acatar, saber ouvir, dar atenção, ser atento ao que alguém tem a lhe ensinar, ter consideração. Não tem a ver com culto de personalidade, bajulação, tampouco a pajear alguém.

Por isso a importância do livre-arbítrio, do poder que cada indivíduo tem de escolher suas ações, que caminho quer seguir.

Pode um homem ser privado de sua liberdade, não lhe sendo permitido mover-se à vontade; porém, o livre-arbítrio continuará atuando internamente, já que ninguém poderá impedir a atividade dos pensamentos dentro de sua mente​.

Portando, ao se deparar ou descobrir uma pessoa tóxica, principalmente no meio marcial, não se prive de sua liberdade. Não fique pelo medo, por se sentir mal ou por diversas crenças que tem com respeito às relações. Se em seu interior você notar que precisa se afastar, faça isso.

Com certeza você será questionado com relação a Lealdade e Honra (pilares do Caminho Marcial, juntamente com outras virtudes como a Benevolência, Justiça e Educação). Não desanimes, o senso de Honra implica na consciência de sua dignidade pessoal e de seu valor e, devemos Lealdade àqueles que nos são preciosos, como os membros de nossa família, amigos e àqueles que escolhemos como exemplo a seguir.

Para ser exemplo na vida alguém é necessário muito empenho, muito esforço e uma ação exemplar de cada vez. Não acontece da noite para o dia. Muitas vezes demora muitos anos.

Portanto, no meio marcial e na vida, procure por pessoas honestas, verdadeiras, confiáveis, generosas, disciplinadas, que sejam exemplo e que todos gostem de estar ao seu lado.

Mais claro, tudo é uma questão de escolha, de livre-arbítrio.

(Marcelo Winter – Faixa Preta)